Imagine assistir um filme magnífico e enquanto os créditos sobem a atriz principal aparecer para conversar com o público. Imagine que essa atriz seja ninguém menos que Audrey Tautou, uma das principais atrizes francesas da atualidade, a eterna Amélie Poulain. Isso de fato aconteceu na noite desta sexta-feira, 10 de junho, no Odeon, o cinema mais charmoso do Rio (isso não quer dizer que seja o melhor, até porque minha visão de Tautou foi atrapalhada pela cabeça do sujeito sentado na cadeira da frente).
Audrey Tautou: nem tão bonita assim |
O filme chama-se “Uma Doce Mentira”, de Pierre Salvadori. Esse é o segundo que Tautou faz com o cineasta, mas dessa vez o roteiro foi escrito pensando nela. E deu certo porque o filme é realmente muito bom. É uma fábula engraçada como Amélie Poulain, um romance cheio de atuações fantásticas, com roteiro que faz o tempo passar voando. Trata-se da história de Emilie (Audrey Tautou), uma dona de salão de beleza que recebe carta anônima apaixonada de um de seus funcionários. Após ignorá-la, Emilie decide copiar a carta e enviar para sua mãe, Maddy (a bela Nathalie Baye), que estava depressiva há quatro anos por conta do divórcio. Maddy melhora muito seu auto-estima, como Emilie previa, e sua filha decide escrever novas cartas. É evidente que isso não vai dar certo. Os detalhes da grande confusão que se forma são todos muito bem amarrados no roteiro e, eu pelo menos, não notei nem um buraco. Exceto o fato de, francamente, Maddy, mesmo provavelmente beirando os 50 anos, ser muito diferente fisicamente da filha – leia-se muito mais bonita, já que, apesar de talentosa, Audrey Tautou não ser lá uma musa.
A conversa com Audrey Tautou e o produtor do filme, Philippe Martin, decepcionou um pouco, principalmente pelo público que repete perguntas como “O que te inspirou para ser atriz?” É aquela velha necessidade de aparecer. O idiota vai ao debate com a ideia fixa de que tem que pegar no microfone e fazer uma pergunta. Como é um idiota, como disse anteriormente, ele faz uma pergunta estranha ou repetitiva e muitas vezes ainda a formula mal. Dá uma enorme vergonha alheia. E o pior é que Tautou não é desses artistas que divagam por 40 minutos acerca das pequenas coisas que a inspira e que a faz refletir sobre sua atuação e carreira e o porquê do céu ser azul. A eterna Amélie Poulain se parece com alguns de seus personagens quando dá respostas objetivas como “Não sei o que me inspirou a ser atriz. Eu apenas gostava de teatro, de cinema e de atuar.”
Houve, no entanto, alguns comentários interessantes da atriz francesa. O mais aplaudido foi quando ela disse que recebeu outros convites para trabalhar em Hollywood depois de ter feito O Código Da Vinci (para mim, a grande vergonha da carreira de Ron Howard, que fez o inesquecível Frost/Nixon), mas decidiu não aceitar porque não quer fazer carreira lá. E completou dizendo que se surpreendia de ver que o cinema francês poderia lotar uma sala tão grande quanto a do Odeon – já disse que é o cinema mais charmoso do Rio? – e que havia um público brasileiro que resistia à invasão do cinema americano. Ela também mencionou os filmes em que foi dirigida por Stephen Frears e Alain Resnais, quando perguntada sobre os que mais gostou de fazer, apesar de fazer aquele discurso típico do “é muito difícil escolher um só filme”.
Se você imagina que ser eternamente reconhecida como Amélie Poulain a incomoda, segundo ela, não é verdade. Tautou diz que se o personagem faz tanto sucesso, isso significa que ela fez um bom trabalho. Não me convenceu. Toda vez que alguém da plateia fazia algum comentário sobre O Fabuloso Destino de Amélie Poulain como “eu assisti 30 vezes” ou “ele mudou a minha vida”, ela não esboçava sequer um sorriso, mesmo sendo, em geral, sorridente.
Além de sorridente, ela é baixinha e magrinha. Foi simpática ao dar um autógrafo a um senhor que a abordou no corredor e não mostrou incômodo com os tietes que a fotografavam incessantemente – em sua maioria adolescentes, o que me surpreendeu. No entanto, ela não parece ter, pessoalmente, o mesmo charme de suas personagens. Os olhares penetrantes e sensuais de filmes como “Coco antes de Chanel” e o próprio Amélie Poulain não ficaram explícitos. Na verdade, nota-se em Tautou uma certa timidez.
Quanto à relação com o Brasil, não houve muitos comentários. Nada dos clichês do tipo “O Rio é uma cidade linda” ou “Adoro o Brasil”, mas também nenhum comentário que demonstrasse algum conhecimento do país. Exceto o apreço por Walter Salles e por seu Central do Brasil. Perguntada sobre atuar no Brasil, ela disse que precisa melhorar o português e que a decisão não depende dela apenas, é preciso haver um convite. Quando disse isso, lembrei de Vincent Cassel, que já atuou aqui em um belo filme de Heitor Dhalia, À Deriva. Tomara que a pergunta - uma das que não foram repetitivas e estranhas – e a visita ao Brasil tenha plantado em Tautou uma vontade de atuar em terras tupiniquins. Seria uma honra.