Como eu sei que Manuel Bandeira estava muito triste quando escreveu seu poema “Vou-me Embora pra Pasárgada”, decidi enviar-lhe alguns conselhos:
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Mulher, é claro! Tinha que ser mulher. A primeira coisa que passou pela sua cabeça para escrever esse poema foi mulher. Mas eu te entendo, caro Bandeira. Você é dos meus. É um daqueles que acha que é impossível ser feliz sozinho, mas que não acha a mulher certa nem fodendo. Foder faz parte do metiê, é verdade, mas enfim...
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
“Aqui não sou mais feliz” é um verso contundente. Veja você que se a primeira coisa que lhe faz querer ir para Pasárgada é mulher e a segunda é que você não é mais feliz aqui (seja lá onde for “aqui”), conclui-se rapidamente que para ser feliz você julga precisar de uma mulher. E o pior é que você tinha a maior fama de pegador. Mas cuidado, Bandeira, não dê tanta moral a elas. Elas podem ser perigosas. Aí você vem com esse papo de que “Lá a existência é uma aventura”. Se vivesse no Rio de Janeiro de hoje em dia certamente não teria a ousadia de escrever isso. Convenhamos, há cidade com mais aventuras que o Rio de Janeiro? Aqui temos um trem que vira e mexe sai por aí desgovernado fazendo as pessoas se jogarem na estação. Temos pivetes que correm atrás de você em plena Avenida Rio Branco. Temos jovenzinhos fazendo pega na Zona Sul. Flanelinhas que arranham seu carro se você não pagar 20 reais para estacionar. Ahh, Bandeira, francamente. E ainda completa dizendo “De tal modo inconsequente.” O fim dessa estrofe é incompreensível. Como diria o poeta (outro poeta): O que tem o cu a ver com as calças?
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Cara, tem tudo isso no Rio, não precisa ir para Pasárgada! Tem um monte de academias aqui e tem agora aquelas estações onde você pode alugar bicicletas, se essa é a preocupação. Lá pras bandas de Santa Cruz deve ter burro para você montar e, porque mora em Santa Cruz, ele já deve ser brabo. Pau-de-sebo tem na feira de São Cristóvão em época de Festa Junina. Banho de mar tem no Rio a dar com pau, e rio tem um monte também: Rio Maracanã, Rio Pavuna, Rio Sarapuí... Só beleza! E pagando, você arruma uma mãe d’água que te conta a história que você quiser.
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
Eu sei que foi depois que você morreu, mas hoje temos uma coisa chamada pílula contraceptiva. Uma beleza, viu? Mas que diabos é um telefone automático? Quanto ao outro problema, já ouviu falar em Termas Aeroporto? Fica ali na Glória, muito famoso e você encontra essas coisas aí dos últimos parágrafos.
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Não fica assim, não, meu camarada. Isso passa! E não adianta ir para outro lugar, você sempre será a mesma pessoa. Acho que você está é precisando fazer análise.
Pela primeira vez li Manuel Bandeira e gostei. HAHA. Genial!
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