domingo, 14 de novembro de 2010

Não vá para Pasárgada, Bandeira!

Como eu sei que Manuel Bandeira estava muito triste quando escreveu seu poema “Vou-me Embora pra Pasárgada”, decidi enviar-lhe alguns conselhos:

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei


Mulher, é claro! Tinha que ser mulher. A primeira coisa que passou pela sua cabeça para escrever esse poema foi mulher. Mas eu te entendo, caro Bandeira. Você é dos meus. É um daqueles que acha que é impossível ser feliz sozinho, mas que não acha a mulher certa nem fodendo. Foder faz parte do metiê, é verdade, mas enfim...

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconseqüente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive


“Aqui não sou mais feliz” é um verso contundente. Veja você que se a primeira coisa que lhe faz querer ir para Pasárgada é mulher e a segunda é que você não é mais feliz aqui (seja lá onde for “aqui”), conclui-se rapidamente que para ser feliz você julga precisar de uma mulher. E o pior é que você tinha a maior fama de pegador. Mas cuidado, Bandeira, não dê tanta moral a elas. Elas podem ser perigosas. Aí você vem com esse papo de que “Lá a existência é uma aventura”. Se vivesse no Rio de Janeiro de hoje em dia certamente não teria a ousadia de escrever isso. Convenhamos, há cidade com mais aventuras que o Rio de Janeiro? Aqui temos um trem que vira e mexe sai por aí desgovernado fazendo as pessoas se jogarem na estação. Temos pivetes que correm atrás de você em plena Avenida Rio Branco. Temos jovenzinhos fazendo pega na Zona Sul. Flanelinhas que arranham seu carro se você não pagar 20 reais para estacionar. Ahh, Bandeira, francamente. E ainda completa dizendo “De tal modo inconsequente.” O fim dessa estrofe é incompreensível. Como diria o poeta (outro poeta): O que tem o cu a ver com as calças?

E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada


Cara, tem tudo isso no Rio, não precisa ir para Pasárgada! Tem um monte de academias aqui e tem agora aquelas estações onde você pode alugar bicicletas, se essa é a preocupação. Lá pras bandas de Santa Cruz deve ter burro para você montar e, porque mora em Santa Cruz, ele já deve ser brabo. Pau-de-sebo tem na feira de São Cristóvão em época de Festa Junina. Banho de mar tem no Rio a dar com pau, e rio tem um monte também: Rio Maracanã, Rio Pavuna, Rio Sarapuí... Só beleza! E pagando, você arruma uma mãe d’água que te conta a história que você quiser.

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar


Eu sei que foi depois que você morreu, mas hoje temos uma coisa chamada pílula contraceptiva. Uma beleza, viu? Mas que diabos é um telefone automático? Quanto ao outro problema, já ouviu falar em Termas Aeroporto? Fica ali na Glória, muito famoso e você encontra essas coisas aí dos últimos parágrafos.

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei


Vou-me embora pra Pasárgada.

Não fica assim, não, meu camarada. Isso passa! E não adianta ir para outro lugar, você sempre será a mesma pessoa. Acho que você está é precisando fazer análise.

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